sábado, 27 de fevereiro de 2010

Servidão contratual


Eu fico impressionado com a visão presente em muitos materiais didáticos sobre a relação entre senhores feudais e os camponeses por ele dominados e explorados através do regime conhecido por servidão.

Por exemplo, na apostila para ensino fundamental do Sistema Positivo de Ensino, ao tratar da servidão, não é usada nenhuma vez a palavra exploração, o mesmo ocorrendo com a palavra dominação, ou qualquer outra similar. Pelo contrário, ao falar das obrigações servis, o texto da apostila diz o seguinte:

“Em troca das terras cedidas aos camponeses, eles deveriam trabalhar alguns dias por semana nas terras do senhor...” (p.28).

A idéia de fundo aqui é que a servidão é uma relação contratual voluntária entre senhores de terra e camponeses, com cada um tendo suas obrigações e seus benefícios na relação e todos sendo felizes para sempre.

Fica parecendo que o senhor Jesus Cristo passou a escritura das terras européias aos bons e nobres senhores feudais e que os camponeses, recém-chegados de Marte, ficavam muito felizes em receber uma porçãozinha de terra dos bons nobres, bondade esta retribuída com alguns favores bobinhos, que não custavam nada...

É uma distorção altamente ideológica, que, talvez inconscientemente, emula a idéia de que as relações entre classes dominantes e classes subalternas não são baseadas na dominação e na exploração, mas, sim, em relações de trocas de serviços benéficas para todas as partes.

3 comentários:

  1. Vou aproveitar o espaço aqui para "testar uma hipótese" também.

    Acho que isso, como outras tantas questões, é fruto de uma retroprojeção dos autores de livros didáticos. Ideologicamente, também não é o trabalho assalariado um contrato entre duas pessoas livres, proprietárias de seus próprios corpos e que entram numa relação voluntária?

    Nesse sentido, o problema nos livros didáticos é duplo e ainda mais profundo: a operação ideológica não ocorre sobre o contexto medieval - um contexto que, no final das contas, vale muito pouco numa disputa mais geral -, mas sobre a sociedade contemporânea. O segundo problema é uma total incapacidade de historicizar a sociedade, o que existe aqui como obstáculo para conceber relações de produção medievais que sejam, num nível estrutural, diversas das capitalistas.

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  2. Talvez o problema da incapacidade de historicizar as sociedades em geral nos livros didáticos seja também um efeito da ideia - mais forte em apostilas - de aproximar o conteúdo da realidade do aluno. A operação ideológica entra aí: a aproximação não é com a opressão e a exploração, mas com o contrato do Estado de direito.

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  3. é verdade senhor é imprecionante como existem pessoas que ainda continuam alienadas com esse assumnto visitei seu cite para fazer uma pesquisa para um trabalho de escola que tem esse tema e achei muito imteresante sua opinião
    marcelly mira do pará
    colegio: sistema ekite de ensino em 29 de abril de 2010

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